Mãe azul: visibilidade e inspiração
Chegamos à ultima parte da entrevista com Chimena Gama, professora de português, especialista em educação inclusiva e mãe do lindo Álvaro, o Alvi, um garoto de 9 anos que tem transtorno do espectro do autismo (TEA).
Este foi um trabalho que fizemos para dar mais visibilidade às questões do autismo neste mês especial, que é o Abril Azul. E estou muito feliz com o resultado destas postagens, que trazem a vivência da minha amiga Chimena e algumas informações importantes sobre o TEA. Estou muito feliz porque, a partir disso, fomos capazes de plantar algumas sementinhas e proporcionar a outros pais acolhimento e forças para lutar pelo desenvolvimento de seus filhos.
Nas partes anteriores, a Chimena falou sobre diagnóstico, tratamentos, escola regular, rotina e maternidade. Na publicação de hoje, vamos falar sobre a importância do Abril Azul e inspirações.
Os termos em negrito são mais bem explicados ao final da entrevista.
ÉRICA: Qual a importância do Abril Azul para as pessoas que têm autismo?
CHIMENA: Há pessoas que acham bobagem caminhadas, campanhas etc. Dizem "precisa pensar no autismo o ano todo!". Claro! Porém precisamos ter foco. Quando algo é mencionado o tempo todo acaba ficando "batido". Ter um mês dedicado a falar sobre autismo e bombardear as pessoas com o tema é muito bom. Dá visibilidade à causa, sem cansar aqueles que ainda não a abraçaram. Sempre há muitos bons eventos no Abril Azul em todo o Brasil, muitos, inclusive, online. Importantíssimo.
E: O que você indica como fonte de apoio e inspiração para pais de crianças que estão no espectro?
C: Logo que recebemos o diagnóstico, compramos o livro Mundo singular [editora Fontanar], da Ana Beatriz Barbosa. Acho-o excelente, sempre indico a pais novos. Também adoro o filme sobre a vida da Temple Grandin [Temple Grandin, dirigido por Mick Jackson]. Dá uma boa ideia de como é crescer autista e da importância da educação dada pelos pais (a mãe, no caso dela). Um livro dela também é ótimo, chama-se O cérebro autista [editora Record], mas é um pouco mais científico, pode ser uma leitura chata para quem não gosta dessa abordagem. Eu AMEI um livro de jornalistas americanos que conta toda a história do autismo nos Estados Unidos e em boa parte do mundo. Tem muita informação sobre a evolução do diagnóstico, do tratamento etc. Chama-se Outra sintonia [de John Donvan e Caren Zucker, editora Companhia das Letras]. Existem muitos documentários bons na internet, muitas reportagens sobre autismo. Mas é preciso tomar cuidado: há muita "cura" de autismo sendo vendida em sites e vídeos, e autismo não é doença nem tem cura.
E: Tem mais alguma coisa que você gostaria de falar?
C: Puxa, falei tanto! [risos] Eu só gostaria de avisar àquelas pessoas que estão desconfiadas... mas não têm certeza ou não querem ter certeza do diagnóstico do filho... não protelem os tratamentos! A intervenção precoce é de enorme importância e eficácia! Precisa começar o quanto antes... não esperem a segunda ou terceira opinião! É muito comum os pais negarem o diagnóstico, há um luto, entende-se que para alguns é difícil aceitar. Mas... não tratar... demorar... isso pode ter consequências. O autista tratado adequadamente evolui muito, consegue grandes avanços. Tratar seu filho, mesmo que lhe doa achar que ele tem autismo, é um ato de amor.
Para entender melhor
Visibilidade
Foi em 2007 que o dia 2 de abril foi estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) como Dia Mundial da Conscientização do Autismo. E a principal função deste tipo de data é trazer visibilidade para o assunto que celebra. Quando todas as atenções e esforços de divulgação se concentram em um determinado assunto, num determinado dia (ou mês), fica muito mais fácil destacar a causa e os temas relacionados que demandam debate e/ou esclarecimentos.
Atrair visibilidade para a questão do autismo é um ótimo recurso para desmistificar os tabus que rondam esta condição, fornecendo mais informações e dando rosto e fala a seus protagonistas, o que diminui as fantasias e os preconceitos que a rondam. Além disso, neste período, divulgam-se direitos e características do transtorno do espectro do autismo (TEA), ajudando pais e responsáveis a buscar por diagnóstico e tratamento adequados, além de chamar a atenção para a necessidade da ampliação da rede de atendimento, principalmente pública.
Cura do autismo
Com os recursos de que dispomos hoje em dia, ainda não existe cura do autismo. O TEA é uma condição que deriva de desenvolvimento e funcionamento diferentes do cérebro, não é como uma doença que possa ser curada.
É possível, sim, que, com os tratamentos adequados, os sintomas regridam e que, em raros casos, nem possam ser notados, mas a condição não deixa de existir. Portanto, é importante que os pais estejam atentos para não acreditar em dietas ou medicações milagrosas que prometem curar o autismo, porque, ao contrário, elas podem ser muito nocivas à saúde.
Intervenção precoce
A chamada “intervenção precoce” é aquela que ocorre entre 0 e 3 anos de idade e pode ser iniciada se é notado algum atraso no desenvolvimento da criança. Muitos pais e responsáveis não aderem à intervenção precoce porque acreditam ser muito cedo para dar um diagnóstico para a criança, sendo às vezes até orientados por profissionais nesse sentido. O cuidado é compreensível, pois há o receio de “estigmatizar” a criança num período em que ela ainda está em pleno desenvolvimento e causar ainda mais ansiedade nos pais. Porém, é justamente por este ser um período muito rico do desenvolvimento humano que a intervenção é tão importante. Portanto, não é errado dizer que tratar corretamente é mais importante do que ter um diagnóstico exato. E a estimulação só tem benefícios a trazer.
Aprender sobre o mundo azul sob o olhar de uma pessoa que de fato tem vivência sobre o assunto é uma grande oportunidade, uma oportunidade de aprender e treinar a escuta. Fico muito feliz por ter tido e proporcionado essa experiência. Muito obrigada à amiga Chimena e à sua família linda, que generosamente se ofereceram para nos ensinar tanto.
Confira também as demais partes da entrevista, em que conversamos sobre diagnóstico, tratamento, escola, rotina e maternidade.
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